Felipe Salustino
Repórter
O Governo do Estado vai apresentar, na manhã desta
sexta-feira (1º), um pacote de medidas para mitigar os impactos da taxação de
50% estabelecida pelo governo de Donald Trump aos produtos brasileiros vendidos
aos Estados Unidos. O chamado “tarifaço” começa a valer na próxima quarta-feira
(6) e afeta oito dos dez produtos potiguares que mais foram exportados para o
mercado americano no primeiro semestre de 2025. De acordo com a Federação das
Indústrias do RN (Fiern), estimativas das indústrias exportadoras indicam que
entre R$ 70 milhões e R$ 100 milhões em exportações podem deixar de ser
comercializados por ano com o aumento das tarifas. Estima-se ainda que 4 mil
postos de trabalho estejam em risco.
Uma Nota Técnica publicada pela Secretaria de
Desenvolvimento do RN (Sedec) nesta quinta-feira (31) aponta que, de janeiro a
junho de 2025, o valor total exportado pelo RN para os EUA foi de US$ 67,1
milhões. Os dez principais produtos exportados somaram, somente no 1º semestre,
US$ 58,1 milhões. Ainda conforme o documento, aproximadamente 48,1% do volume
financeiro das exportações potiguares para o mercado americano seria impactado
pela tarifa adicional de 50%.
“Diante desse cenário, o Governo do RN informa que
adotará todas as medidas cabíveis, em articulação com o Governo Federal, com o
objetivo de dar continuidade às negociações diplomáticas e institucionais,
buscando mitigar os efeitos da medida e preservar a competitividade das
exportações do estado” diz trecho da nota.
O pacote de medidas para mitigar os impactos do
tarifaço será apresentado aos setores afetados, segundo informou o secretário
de Desenvolvimento Econômico do RN, Alan Silveira. Sem dar maiores detalhes,
ele adiantou que o pacote integra um conjunto de ações que incluem benefícios
fiscais, especialmente para as empresas que já fazem parte do o Programa de
Estímulo ao Desenvolvimento Industrial (Proedi) e que poderão ter isenções
ampliadas. O pacote também deve incluir mecanismos de antecipação de créditos
vinculados à exportação, com a criação de linhas financeiras que permitam às
empresas antecipar recebíveis a taxas mais vantajosas.
Roberto Serquiz, presidente da Fiern, disse que as
possíveis alternativas para reduzir os efeitos do tarifaço estão em fase de
‘gestação’ e comentou que ainda espera uma reversão da medida. “É um desafio
buscar essa reversão em tão curto espaço de tempo, mas a gente acredita que
isso possa acontecer. O que não podemos é deixar que o ambiente político
interfira tanto na economia. Para além disso, uma das saídas de mitigação dos
impactos é buscar a recomposição de custos e abrir mercados”, aponta Serquiz.
Ele ressaltou que a indústria não planeja demissões,
pois está sempre voltada ao desenvolvimento e à geração de empregos. No
entanto, caso as dificuldades persistam, adaptações poderão ser necessárias nos
setores exportadores.
“Infelizmente, diante desse cenário, pode se tornar
impossível manter [todos os empregos nos segmentos que exportam para os EUA].
Ninguém fica feliz com cortes. Quando há desligamentos, é porque há risco à
sustentabilidade ou necessidade de redesenhar o próprio negócio”, pontuou
Serquiz.
Medidas
As
medidas que serão apresentadas pelo Governo nesta sexta visam dar algum respiro
às atividades afetadas. O setor de pesca, o mais atingido em quantidade de
exportação, com cerca de 80% dos produtos enviados ao mercado norte-americano,
irá pedir ao Governo do Estado a isenção total do ICMS que incide sobre o
combustível das embarcações.
“Sobre a isenção, estamos protocolando um documento
a pedido do Governo. Queremos que a medida vigore até o final do ano. E na
segunda, vamos nos reunir com a DRT [Delegacia Regional do Trabalho] para ver
questões de contratos de trabalho. Essa é a alternativa que a gente observa
para manter a viabilidade da atividade pesqueira. No nosso caso, não adianta
buscar novos mercados, porque na Ásia e na Oceania há competidores que estão
bem mais próximos”, disse Arimar Filho, presidente do Sindipesca.
“Além do que, a logística para os dois continentes
custa muito caro ao nosso mercado. E para a Europa, desde 2018 o Brasil é
proibido de exportar por uma questão que envolve aspectos técnicos, mas também
políticos. Então, a gente não tem saída quanto a novos destinos”, completou
Arimar. As exportações da pesca potiguar aos EUA movimentam mais de R$ 250
milhões ao ano, com mais de 2,5 mil empregos.
Doces, sal e reciclagem também serão
afetados
A indústria de doces e pirulitos será a segunda
atividade no Rio Grande do Norte mais afetada pela taxação, uma vez que 70% das
exportações desse setor têm como destino os Estados Unidos. Luiz Eduardo Simas,
que integra o Sindicato de Doces do RN, disse que as empresas exportadoras
estão em contato com o Governo do Estado, por meio da Fiern, para entender
quais medidas serão oferecidas para aliviar os impactos. “O que o setor tem
feito é negociar para que demissões e perdas no faturamento não se concretizem.
Não temos falado expectativas de números nem sobre possíveis perdas, porque
preferimos esperar a entrada em vigor da medida”, explicou Simas.
O setor de sal, que tem metade das exportações
voltadas ao mercado americano, disse que a taxação vai representar perda de
empregos e prejuízos às empresas, que não terão para onde direcionar os
próprios produtos. “Não temos muitos outros mercados. Nós exportamos 550 mil
toneladas aos EUA por ano. Por conta da logística e do fato de o sal ser um
produto de baixo valor, ele não consegue ser competitivo quando se colocam
distâncias muito maiores do que os Estados Unidos. Portanto, estamos fadados a
esse mercado, em um primeiro momento”, explicou Aírton Torres, presidente do
Siesal.
“De todo modo, junto com o Governo do Estado estamos
vendo a possibilidade de abrir um pouco mais para a Europa”, frisou Aírton
Torres. Ainda segundo ele, o setor gera cerca de 4 mil postos de trabalho no
RN, volume que será atingido pela taxação. “Ainda não temos como quantificar
esse impacto, mas sabe-se que, além dessas pessoas, aquelas outras ligadas à
cadeia de distribuição sentirão os efeitos.
Estamos desenhando alternativas com o apoio da Fiern
para encontrar algum tipo de incentivo junto ao Governo do Estado para
compensar, ainda que parcialmente, os prejuízos”, disse.
O quarto setor que mais irá sentir o peso do
tarifaço é o de reciclagem, que destina 30% dos produtos exportados aos Estados
Unidos.
Etelvino Patrício, presidente do Sindirecicla-RN,
disse que o real valor dos efeitos só será conhecido após a medida do governo
americano passar a valer. O que o setor tem feito, segundo Etelvino, é procurar
novos destinos para tentar compensar as perdas com a taxação.
“Nosso planejamento é tentar buscar novos mercados e
novos clientes, para que a gente possa suprir as perdas que teremos, mesmo
entendendo que, em casos de precificação, não conseguiremos mercado melhor do
que o americano”, pontuou.
Fruticultura
Para
a fruticultura potiguar, cujo impacto deverá ser de R$ 100 milhões ao ano, a
Federação da Agricultura e Pecuária do RN (Faern) esclareceu que também tem
buscado alternativas para o tarifaço. “Está sendo elaborada uma proposta de
crédito emergencial voltada a produtores que precisam manter contratos de
trabalho, mesmo diante de uma redução temporária de produção. Além disso, a
Faern defende que prefeituras atuem de forma proativa, ativando redes locais de
proteção social e ampliando compras públicas de frutas para merenda escolar,
como forma de sustentar o escoamento da produção e proteger os empregos”,
afirmou José Vieira, presidente da Federação.
“A Faern também defende a criação de uma frente
interestadual da fruticultura irrigada, reunindo RN, PE, BA e CE. Essa
articulação permitirá uma resposta coordenada, fortalecerá a defesa dos
interesses do semiárido fruticultor e ampliará o poder de negociação do setor
em âmbito nacional e internacional”, completou Vieira.
O Comitê Executivo de Fruticultura do RN (Coex),
projeta um fechamento de 1,5 mil postos de trabalho com a taxação, o que, de
acordo com José Vieira, representa cerca de 25% da força de trabalho do setor
na alta temporada. “Isso impacta diretamente municípios como Mossoró, Baraúna e
Apodi, onde a fruticultura representa até 40% da economia local”, explicou.
BALANÇO
Principais
produtos exportados pelo RN aos EUA
(1º semestre de 2025)
Óleo combustível:
US$ 23,9 milhões
Outros produtos de origem animal:
US$ 10,3 milhões
Albacoras-bandolim frescos:
US$ 4,7 milhões
Caramelos e confeitos:
US$ 4,1 milhões
Sal marinho:
US$ 3,3 milhões
Albacoras/atuns:
US$ 3,2 milhões
Outros granitos:
US$ 2,6 milhões
Outros açúcares de cana:
US$ 2,1 milhões
Outros peixes congelados:
US$ 2 milhões
Castanha de caju:
US$ 1,9 milhão
Total: US$ 58,1 milhões
Produtos excluídos do tarifaço
Óleo combustível: US$ 23,9 milhões
Castanha de caju: US$ 1,9 milhões
Total: US$ 25,8 milhões
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