Ao longo das quatro últimas décadas, o Brasil perdeu
anualmente uma média de 2,9 milhões de hectares de áreas naturais, segundo
estudo do MapBiomas divulgado nesta quarta-feira. O impacto deste cenário
significa uma redução de 111,7 milhões de hectares entre 1985 e 2024, total que
corresponde a 13% do território nacional e supera o tamanho da Bolívia. Durante
esse intervalo, o percentual de municípios brasileiros cuja agropecuária
acumula a maior parte de sua extensão subiu de 47% para 59%.
O levantamento destaca que o processo de
transformações, que trazem impactos significativos nas áreas naturais e na
expansão da agropecuária, não se deu de maneira uniforma. A primeira década
estudada é apontada como responsável pela expansão do desmatamento no Brasil.
No início da série histórica, em 1985, o país tinha 80% do território coberto
por áreas naturais. Ao longo dos dez anos, foi registrado um aumento de 36,5
milhões de hectares de áreas antrópicas, cenário impulsionado pela expansão de
pastagens e o crescimento da urbanização, o que levou a redução da cobertura
natural brasileira para 76%.
O total de floresta suprimida foi superado na década
seguinte, entre 1995 e 2004, quando a conversão de vegetação nativa para a
agropecuária totalizou 44,8 milhões de hectares no Brasil. A expansão esteve
presente, sobretudo, na pastagem, com 35,6 milhões de hectares, enquanto o
crescimento da agricultura no período foi de 14,6 milhões de hectares. Na
Amazônia, houve a apropriação humana de 21,1 milhões de hectares e a
consolidação do chamado “arco do desmatamento”. Até 2005, o percentual de
cobertura natural era de 72%.
A década que transcorreu de 2005 até 2014 foi
marcada por apresentar o menor incremento de área antrópica em 40 anos, com
crescimento de 17,6 milhões de hectares, além de registrar redução da perda de
vegetação nativa. No período, a perda líquida ficou em 17,1 milhões de hectares
— também o menor valor em quatro décadas. Desse total, 15,4 milhões de hectares
eram de florestas.
“Há a concentração do desmatamento no Cerrado,
principalmente na região conhecida como Matopiba, que abrange os estados do
Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia. A pesquisa mostra que 80% dessa perda de
vegetação para a agricultura ocorreu nestes territórios”, aponta Marcos Rosa,
coordenador técnico do MapBiomas.
Também foi nesta década que ocorreu a maior expansão
da agricultura temporária (12,5 milhões de hectares) e 20,9 milhões de hectares
de vegetação nativa foram convertidos para pastagem. O período, no entanto, foi
quando a área de pastagem parou de crescer no Brasil. O MapBiomas destaca
também o crescimento da silvicultura nestes dez anos, com acréscimo de 2,5
milhões de hectares.
A década mais recente, entre 2015 e 2024, teve a
expansão da mineração como destaque. O crescimento de 58% foi concentrado,
sobretudo, na Amazônia (66%). Foi neste período também que o Pampa registrou a
maior taxa de supressão de campos — perda de 1,3 milhões de hectares — de modo
que a área agrícola passou a superar os campos nativos usados para pecuária. No
ano passado, eram 7,9 contra 5,8 milhões de hectares.
Estes dez anos também tiveram uma desaceleração da
expansão agrícola em todos os biomas, principalmente no Cerrado e na Mata
Atlântica, onde a expansão foi 2,7 milhões de hectares e 3 milhões de hectares
menor que na década anterior, respectivamente. Entretanto, o levantamento
alerta para o surgimento de uma nova fronteira de desmatamento na Amazônia, a
Amacro — composta pelos estados do Amazonas, Acre e Rondônia.
Os pesquisadores também identificaram que os ciclos
de inundação no Pantanal tem reduzido a cada década, e o ano de 2024 foi o mais
seco nos 40 anos. A Amazônia também enfrentou secas severas no período, com
oito dos dez anos de menor superfície de água da série histórica registrados
entre 2015 e 2024. O Brasil chega, então, a 2024 com 65% do território coberto
por vegetação nativa e 32% pela agropecuária.
“Há um cenário de desafios. Precisamos evitar o
retrocesso do avanço legislativo de proteção da natureza conquistado nessas
quatro décadas, além de termos que lidar com o controle de queimadas derivadas
das mudanças climáticas e a diminuição do ciclo de cheias no Pantanal”, afirma
Marcos Rosa. — Por outro lado, temos oportunidades com a melhoria do manejo da
área de pastagem, o qu garante melhor proteção do solo e produtividade.
Transição para a agropecuária
Nestas quatro décadas, a formação florestal foi o
tipo de cobertura que mais perdeu área no Brasil, com uma redução de 15% ou
62,8 milhões de hectares — total ligeiramente superior ao território da
Ucrânia. A formação savânica vem em seguida, com uma diminuição de 25% ou 37,4
milhões de hectares, uma área maior que o território da Alemanha.
Por outro lado, a pastagem e a agricultura foram os
usos da terra que mais se expandiram no período. A área ocupada com pastagem
cresceu 62,7 milhões de hectares (+68%) e a agricultura, 44 milhões de hectares
(+236%).
Se em 1985 420 municípios tinham predomínio de
agricultura, em 2024 esse número saltou para 1.037. Já as cidades cuja pastagem
é predominante não se expandiram na mesma velocidade, passando de 1.592 para
1.809 no período. Proporcionalmente ao tamanho dos territórios, os estados com
maior área de agricultura são Paraná (34%), São Paulo (33%) e Rio Grande do Sul
(30%).
Os dados mostram também um crescimento da
silvicultura de 7,4 milhões de hectares, ou 472%. No ano passado, mais da
metade destas áreas estavam no bioma Mata Atlântica (50,6%), seguido do Cerrado
(37%) e do Pampa (8%).
O MapBiomas também mostra que o período de 1985 a
2004 anos foi marcado por taxas de ganho de pastagem que superavam a área de
perda. Nos períodos seguintes, no entanto, foi observada uma estabilidade no
valor. Os pesquisadores observam uma maior perda destas áreas na Caatinga, Mata
Atlântica e Cerrado, enquanto a Amazônia lidera o ganho de novas áreas de
pastagem, seguida de perto pelo Pantanal.
Quase sete em cada dez (67,5%) das áreas convertidas
em pastagem por década ocorreu sobre áreas de formação florestal e savânica. Na
contramão, 25% das terras que deixaram de ser pastagem voltaram a ser florestas
ou savanas.
Secas mais recorrentes
Os pesquisadores apontam que as áreas úmidas
brasileiras ocupavam 84 milhões de hectares, ou quase 10% do território
nacional, em 195. Já em 2024, eram 74 milhões de hectares, ou 8,8% do tal
brasileiro. Aos longo dos 40 anos, todos os biomas perderam superfície de água,
com exceção da Mata Atlântica, por conta da criação de reservatórios e
hidrelétricas a partir dos anos 2000. Os dados mostram que as reduções mais
drásticas ocorreram no Pantanal, cuja superfície de água em 2024 esteve 73% abaixo
da média registrada nas quatro décadas.
O Globo
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