Após dois anos de calor contínuo e escorchante, o
inverno de 2025 no Sudeste e Sul do Brasil traz o tempo de matar a saudade do
velho normal. E pelo menos até meados deste mês de agosto, o friozinho segue
firme, como se espera que aconteça no inverno, afirma o meteorologista Marcelo
Seluchi, coordenador de operações do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas
de Desastres Naturais (Cemaden).
Não houve o que pode se chamar de inverno nos anos
de 2023 e 2024, os mais quentes da História. Mas este ano, as temperaturas têm
se mantido em sua maior parte dentro da média histórica da estação, com algumas
pequenas anomalias de frio no Sul, considerados junho e julho, normalmente os
meses mais frios.
“A verdade é que muita gente pensa que estamos tendo
um frio excepcional porque esquecemos como era o inverno. Mas é apenas uma
sensação. O inverno está dentro da normalidade. Por exemplo, em junho, o Sul
teve uma anomalia, mas isso acontece. Às vezes, um mês fica abaixo da média num
local, mas isso é esperado”, destaca Seluchi.
Em junho, o Sul ficou abaixo da média histórica. Em
julho, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), foi o Rio de
Janeiro. Mas essas oscilações são esperadas. E, acrescenta Seluchi, no
Centro-Oeste e em parte das Amazônia o inverno está até mais quente do que a
média histórica.
“A gente tem o viés de pensar em grandes cidades,
como Rio de Janeiro e São Paulo, que tiveram um ou outro dia de frio
excepcional. Mas se olharmos o todo, está dentro da normalidade. Por exemplo,
no inverno de 2020 geou muito em cidades paulistas do Vale do Paraíba”, observa
Seluchi.
Segundo ele, o friozinho típico invernal deve seguir
pelo menos até o fim da segunda semana de agosto.
“O que pode estar ajudando a criar a sensação de
frio é a sequência de frentes frias, como essa dessa semana, associada a um
ciclone extratropical, que trouxe ressaca. E na semana que vem haverá outra.
Nos estados do Rio de Janeiro e São Paulo nas próximas duas semanas o frio
ficará na média e, por vezes, até abaixo dela. O frio segue firme”, salienta
Seluchi.
Meteorologistas explicam que as temperaturas abaixo
dos 20°C que se tornaram frequentes desde junho não são excesso de frio, mas
falta de memória do que é um inverno. O calor que superou com frequência e
facilidade os 30°C durante os “invernos” de 2023 e 2024 parece ter derretido as
lembranças dos invernos verdadeiros de outrora.
Seluchi diz que a configuração da atmosfera está
favorecendo nas últimas semanas a condição de frentes frias passando com
frequência e intensidade.
“Mas isso pode perfeitamente se reverter mais à
frente. Mas no final de agosto e setembro, podemos passar calor, como já
aconteceu outras vezes”, diz ele.
Nem num dos lugares mais frios do Brasil, a Serra da
Mantiqueira (entre RJ, SP e MG), recordes históricos foram superados. Lá fica o
Parque Nacional do Itatiaia (PNI) que tem os recordes de baixas temperaturas,
mesmo no verão devido à altitude acima dos 2.000 metros e as características
geográficas da região. O recorde do Brasil foi registrado lá: -13,3⁰C, em
agosto de 2016.
Tem feito muito frio, mas nada que assombre pela
magnitude, como os recordes de calor, por exemplo, do verão deste ano. Até
agora, a menor temperatura da estação foi em Bom Jardim da Serra, em Santa
Catarina, com -10,3ºC, em 2 de julho, num lugar apropriadamente chamado Terra
do Gelo.
“O inverno deste ano está excelente. Junho e julho,
que são os meses mais frios, nada a reclamar! Um inverno bem padrão mesmo, que
a gente não tinha há alguns anos”, afirma o meteorologista William Siqueira,
que presta consultoria climática a produtores rurais e conhece como poucos a
Mantiqueira.
Siqueira tem 1.500 estações meteorológicas, no
padrão oficial, nos lugares tradicionalmente mais frios do Brasil, fora de
áreas urbanas, normalmente mais quentes. Muitas delas estão em áreas de
propriedades rurais.
Ele explica que as estações dele costumam registrar
temperaturas ainda mais baixas do que as do Instituto Nacional de Meteorologia
(Inmet) porque ficam em áreas propícias ao frio. Já às do Inmet quase sempre
estão em áreas urbanas, que não têm as condições ideais para acúmulo de ar
frio.
Seluchi diz que este é o que se considera um ano
neutro, sem La Niña (mais frio) ou El Niño (mais calor). Porém, a região
central do Oceano Pacífico está um pouco mais fria do que o normal – 0,2°C
abaixo da média – rodeada por águas mais quentes e isso favorece uma atmosfera
em condições relativamente semelhantes às de uma La Niña, caracterizada por
águas do Pacífico pelo menos 0,5ºC abaixo da média.
“Isso poderia explica por que as frentes frias estão
passando com frequência e intensidade e de por que está chovendo um pouco
abaixo da média no Sul, à exceção de alguns episódios muito chuvosos que
tivemos em junho. Fora casos de curta duração, a tendência é de chuva abaixo da
média”, diz Seluchi.
De acordo com ele, existe uma pequena chance de se
formar uma La Niña mais para o final do ano. Mas, por ora, isso é apenas uma
possibilidade.
O Globo
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