O café faz parte da rotina de muitos consumidores,
que não abrem mão da bebida mesmo diante das recentes altas nos preços. Em
Natal, cafeterias precisaram reajustar os valores e adotar estratégias para
manter a clientela e garantir a sustentabilidade do negócio. O aumento no preço
do café tem sido impulsionado por fatores climáticos, crescimento da demanda
global e elevação dos custos de produção e exportação.
O jornalista Thales Vale é um dos consumidores que
mantém o hábito diário de tomar café, independentemente dos reajustes. “Não
deixo de ir à cafeteria, porque tem a questão do ambiente agradável para tomar
um café acompanhando um bate-papo. Tomo café todos os dias, me ajuda a relaxar,
a ficar atento; me considero viciado. Chego a umas dez xícaras por dia”,
afirmou.
Mas para clientes como Thales, ter esse serviço e um
produto de qualidade, com a alta dos preços, tornou-se um desafio maior para os
empresários do segmento. O impacto dos custos levou à necessidade de repasse no
preço final e à adoção de novas estratégias para manter a competitividade.
Widna Gonçalves, que há nove anos comanda a Letra A
– Cafeteria e Tabacaria, próximo à Praça Pedro Velho, em Petrópolis, conseguiu
manter o preço do café expresso estável por dois anos, mas precisou rever essa
política. “Agora vai ficar um pouco inviável, devido à alta do preço do café
com os fornecedores. A maioria dos meus cafés vem de Minas Gerais e aí, além da
matéria-prima, vêm os impostos, ICMS, frete, que é altíssimo. Acabei de fazer
um pedido pelo dobro do valor do que eu geralmente compro”, explicou.
A empresária ressaltou que os reajustes serão de até
20% para diferentes tipos de café, incluindo o expresso. Para minimizar
impactos e manter o público fiel, a cafeteria adotou mudanças no cardápio e
criou promoções voltadas para o público jovem. “Eu acho que a tendência é ou
permanecer nos valores atuais do café no país ou subir mais. Não prevejo que
venha a reduzir, porque tem um cenário de seca que atingiu grande parte das
regiões produtoras”, acrescentou.
A percepção de aumento no preço do café é confirmada
pelos dados do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos
Socioeconômicos (DIEESE). Em Natal, a partir de setembro de 2024, a sequência
de altas tornou o café em pó um dos itens da cesta básica com maior reajuste. Na
comparação de dezembro de 2024 com o mesmo mês do ano anterior, a alta
acumulada chegou a 49,01%.
Com 35 anos de funcionamento na Cidade Alta, a
cafeteria “Avenida Café” também precisou reajustar os preços. “A gente percebe
que diminui um pouco o movimento, mas temos uma clientela fiel. Reajustamos o
preço do café em cerca de 15%”, afirmou a proprietária, Mônica Viana. Ela
destacou que a diversidade do cardápio contribui para reduzir os impactos do
encarecimento do café. “O café é um produto que atrai os clientes e aí eu tenho
um mix de outros produtos, e isso ajuda a enfrentar a crise do preço do café
sem prejuízos”, explicou.
Essa estratégia também é adotada pela empresária
Maria Lúcia Medeiros, do Via Café, em Petrópolis. “Temos um cardápio variado. Além
do café, servimos frutas, sucos, café da manhã, lanches e isso ajudou a evitar
o prejuízo. A gente segurou o preço por um tempo, mas tivemos que fazer um
reajuste em cerca de 15%, tipo R$ 1 no café expresso. Não foi muito, justamente
para não perder a clientela”, frisou.
A empresária diz que, mesmo assim, ainda está
arcando com o custo do aumento no preço do café, porque esse reajuste no
cardápio não compensou. A matéria-prima que ela usa é um grão gourmet vindo
diretamente do Sul de Minas Gerais. Lúcia diz que seu preço subiu cerca de 65%
em relação ao início de 2024. “Essa crise do preço tem sido gritante, nunca
tinha passado por uma assim. Acho que o governo federal poderia fazer algo para
reduzir os custos, diminuir impostos, para estimular os produtores e baixar os
preços”, avaliou.
Previsões
A Associação Brasileira da Indústria do Café (Abic) confirmou que a tendência
de alta deve se manter pelos próximos meses, pelo menos até a colheita da nova
safra, que ocorre entre abril e maio. Segundo a entidade, os preços foram
impactados por eventos climáticos, como a restrição hídrica e as altas
temperaturas que prejudicaram a produtividade das lavouras. Além disso, o
aumento do consumo global e a entrada da China como um novo mercado consumidor
aqueceram a demanda.
A primeira estimativa da safra brasileira de café
para 2025, divulgada pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), apontou
para uma produção total de 51,8 milhões de sacas de café beneficiado, o que
representa uma redução de 4,4% em relação à safra anterior.
Em 2024, o Brasil registrou um recorde na exportação
de café, enviando 50,5 milhões de sacas ao mercado internacional, um
crescimento de 28,8% em relação ao ano anterior. Esse aumento expressivo na
exportação, aliado à valorização do dólar, resultou em estoques internos
reduzidos e preços mais altos para o consumidor final.
Reduzir custos e investir na experiência
do cliente
Diante da alta nos preços do café, o Serviço
Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae/RN) tem auxiliado os
empreendedores do setor de alimentação fora do lar a adotarem estratégias para
minimizar os impactos financeiros e manter a competitividade. A percepção é de
que a combinação de planejamento financeiro, diversificação de produtos e
investimento na fidelização do cliente pode ser a chave para superar este
momento de desafios.
Por meio da comunidade “Expresso Hub”, produtores,
torrefadores, cafeterias, baristas, consumidores e instituições ligadas ao
segmento do café se reunem mensalmente com o Sebrae e a questão da alta nos
preços do grão tem sido um dos temas centrais das discussões. De acordo com
Maria Luíza Moura, gestora de alimentação fora do lar do Sebrae/RN, em janeiro
já se debateu sobre precificação para cafeterias. “Essa questão do aumento dos
preços já era algo que vinha acontecendo desde o final do ano passado”,
explicou.
A necessidade de reajustar os preços nos cardápios
foi inevitável diante do aumento significativo dos custos. Para minimizar o
impacto e manter a atratividade do negócio, o Sebrae tem incentivado
estratégias que agreguem valor ao produto, investindo na experiência do
cliente. Entre as recomendações está a criação de combos promocionais e
temáticos, com nomes criativos e imagens que despertem o interesse do
consumidor.
Além disso, as chamadas “collabs”, parcerias entre
cafeterias e outros estabelecimentos, como salões de beleza e barbearias, têm
sido apontadas como alternativas para ampliar a clientela. “A troca de
experiência com eventos voltados para o cliente final dentro das cafeterias,
encontros temáticos e até a realização de happy hour são estratégias para
proporcionar uma experiência diferenciada e atrativa”, destacou Maria Luíza.
Outra alternativa sugerida tem sido a compra
coletiva de insumos, o que permite uma redução nos custos, mesmo para
cafeterias que trabalham com diferentes tipos de cafés, como os especiais,
gourmets e tradicionais. A aquisição direta de produtores locais ainda não é
uma solução viável em larga escala para as cafeterias de Natal. Segundo Maria
Luíza, apesar da produção existente no Rio Grande do Norte, como o café de
Jaçanã, o volume não é suficiente para atender à demanda dos estabelecimentos
da capital. “Ele não tem vazão para atender todas as cafeterias, então ele
mesmo faz a própria distribuição e venda do café que produz. Já existem algumas
parcerias, mas não são volumosas ainda”, esclareceu.
O Sebrae também oferece consultorias voltadas para a
eficiência do negócio, incluindo precificação, fichas técnicas, marketing
digital, estratégias de comunicação e redução de desperdícios no ambiente de
preparo. O foco é minimizar custos operacionais para que o repasse ao
consumidor final seja o menor possível. “É muito mais interessante e assertivo
que as empresas façam essa redução de custos para precificar melhor e manter
uma margem interessante para o negócio, ao mesmo tempo em que se preocupam com
a experiência do cliente”, reforçou.
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