Qualquer um que tenha linha telefônica já passou
pelo dissabor de receber uma profusão de ligações indesejadas. Não resta muita
saída, a não ser indignar-se, não atender ou desligar o aparelho. A própria
Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) reconheceu o tamanho do problema,
ao apontar que mais de 1 bilhão de chamadas de telemarketing abusivo foram
recebidas mensalmente pelos brasileiros entre junho de 2022 e dezembro de 2024.
O telemarketing abusivo acontece quando uma empresa
faz mais de 100 mil chamadas por dia usando robôs. Elas costumam durar em torno
de seis segundos e são encerradas quando não há resposta imediata. Se o usuário
atende, é transferido a uma central que lhe oferecerá algum produto ou serviço
que não pediu.
A Anatel diz que, desde junho de 2022, quando
entraram em vigor medidas mais duras, 178,7 bilhões de chamadas abusivas foram
bloqueadas, e apenas 15% continuam chegando aos consumidores. Afirma também ter
bloqueado 1.041 usuários de telecomunicações e aplicado R$ 32 milhões em
multas, com base em 24 processos administrativos.
A despeito do bilhão de ligações indesejadas, o
telemarketing abusivo não é o problema mais grave. A maior praga que atormenta
usuários de telefones são as chamadas feitas por estelionatários. É uma questão
ainda mais desafiadora, por envolver o crime organizado. Ligações acontecem o
tempo todo. Há consumidores que recebem uma média de dez por dia.
Os criminosos são tão bem articulados que chegam a
forjar o número das centrais de atendimento dos grandes bancos, levando o
usuário a acreditar falar com uma empresa idônea. Também simulam ligações das
assistentes virtuais para comunicar saques ou Pix indevidos — tudo falso,
obviamente. Se quem atende recusa a chamada, o telefone passa a tocar em
intervalos de dez ou 15 minutos, numa cadência infernal. Não adianta bloquear
os números. A cada ligação, surge um diferente.
Parte dessas ligações é feita de dentro dos
presídios — onde celulares deveriam ser barrados —por criminosos que deveriam
estar afastados do convívio social. Outra aberração. Há casos também em que são
geradas a partir de centrais clandestinas, vez por outra estouradas pela
polícia.
Não é possível deixar o usuário ao deus-dará. Se ele
atende à ligação de um número desconhecido, corre o risco de cair num golpe,
amargando prejuízos colossais. Se não atende, pode perder uma chamada
importante. Não é o consumidor que tem de resolver esse dilema, mas as
autoridades. O celular é um recurso tecnológico indispensável, não pode se
tornar um estorvo.
Editorial O Globo
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