Preocupado com os reflexos negativos na própria
popularidade, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva cobrou de
ministros a definição de estratégias para reduzir danos diante das crises
provocadas pelas mudanças no Pix e a inflação dos alimentos. Os efeitos atingem
justamente setores que o Palácio do Planalto vê como essenciais na tentativa de
reeleição em 2026, como os trabalhadores informais e parcelas da classe média.
A criação às pressas de uma campanha publicitária e a ampliação na oferta de
crédito para produtores rurais, com o objetivo de estimular a oferta, são
algumas das medidas já em desenvolvimento ou em estudo no governo.
Na quarta-feira, a Receita Federal anunciou a
revogação de uma medida que ampliou a fiscalização sobre movimentações financeiras,
como as feitas via Pix. O recuo ocorreu após uma sangria intensa nas redes
sociais, com a falsa narrativa de que o governo taxaria as transações, o que
não estava previsto na norma. Enquanto um vídeo do deputado Nikolas Ferreira
dominava as plataformas — até sexta-feira, eram 314 milhões de visualizações só
no Instagram —, a administração petista seguia acuada.
Lula convocou uma reunião de emergência e, diante
dos ministros Fernando Haddad (Fazenda), Jorge Messias (Advocacia-Geral da
União), Sidônio Palmeira (Comunicação Social) e do chefe da Receita Federal,
Robinson Barreirinhas (chefe da Receita Federal) à mesa, Lula determinou a
volta atrás e a edição de uma Medida Provisória (MP) para “blindar” o Pix e
tentar conter a oposição.
— Não se corre atrás de fake news, que, como vimos,
podem causar um grande mal à nação — afirmou Sidônio ao GLOBO.
Aliados de Lula avaliam que a edição da norma foi
baseada apenas em aspectos técnicos e faltou uma análise política mais ampla
que desse conta dos potencias efeitos negativo. Um outro grupo, no entanto,
acredita que o governo deveria ter insistido e ido para o embate, como expôs o
ministro Renan Filho (Transportes) em entrevista. Pesquisa da Quaest
identificou que 67% das pessoas acreditaram que o Pix seria taxado, e as
menções negativas ao governo nas redes chegaram a representar 86% do total.
Agora, frentes distintas foram abertas para mitigar
o prejuízo. Uma campanha publicitária que já havia sido encomendada pela
Secretaria de Comunicação Social (Secom) às agências sofreu uma modificação e
vai explicar a revogação e, principalmente, desmentir que a gestão taxaria o
Pix. As peças, no entanto, só deverão ir ao ar dias depois do pico de menções
ao tema nas redes sociais. Pesquisa Datafolha de dezembro do ano passado mostra
que 35% da população avalia a gestão como “ótima ou boa”, patamar semelhante
dos que a veem como “ruim ou péssima” (34%).
Outra linha de atuação é capitaneada pela
Advocacia-Geral da União (AGU). O órgão pediu à Polícia Federal a abertura de investigação
para apurar eventuais crimes contra a ordem econômica e avalia uma ação contra
Nikolas, o deputado Gustavo Gayer (PL-GO) e o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ)
pela publicação de vídeos que teriam aumentado a desconfiança sobre o Pix, como
mostrou a colunista Bela Megale. Em meio à onda de fake news, o número de
transações com Pix teve a maior queda no início de janeiro, na comparação com o
mês anterior, desde que o sistema foi implantado.
— Desinformar com o explícito objetivo de obter
ganhos políticos ou econômicos revela o desdém com o bem-estar do povo
brasileiro — acrescenta Messias.
Não é apenas o Pix, no entanto, que vem preocupando
o Palácio do Planalto. Os preços elevados nos supermercados fizeram Lula
distribuir tarefas aos ministros. Em conversas com os auxiliares, o presidente
tem questionado detalhes sobre a oscilação nos preços e determinado a
formulação de políticas públicas que contenham a inflação. Os ministros da
Agricultura, Carlos Fávaro, e do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira, já
receberam essa missão.
A inflação fechou 2024 com alta de 4,83%, acima do
teto da meta. O grupo alimentação e bebidas foi o que teve o maior impacto
sobre a inflação no ano, com alta de 7,69%.
O ponto se torna sensível especialmente após um
campanha eleitoral repleta de promessas de “picanha e cerveja” para a
população. Pesquisas encomendadas pelo governo mostram que o principal motivo
de mau humor com o presidente é o preço da comida. A despeito de explicações
que envolvem itens complexos como a alta do dólar, Lula vem cobrando
alternativas.
Por isso, o tema vem sendo tratado como prioridade
no Ministério da Agricultura. Integrantes da pasta, no entanto, fazem a
ressalva que as medidas que podem ser tomadas não têm resultado imediato. O
estímulo para o aumento da produção de itens da cesta básica, por exemplo,
levaria pelo menos um ano para ter reflexos. Uma das opções cogitadas
internamente é a adoção de linhas com juros mais acessíveis para produtores de
hortifrutigranjeiros. A pasta também vem monitorando de perto os preços da
carne e do café, e uma análise mais detalhada sobre os principais itens
impactados está sendo feito.
O Globo
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