Quase a metade dos medicamentos da lista que deveria estar disponível na Unidade Central de Agentes Terapêuticos do Rio Grande do Norte (Unicat-RN) está em falta para os usuários potiguares. É o que aponta uma lista pública da própria Unicat, vinculada à Secretaria de Estado da Saúde Pública (Sesap-RN) atualizada nesta segunda-feira (04). Ao todo, 95 dos 211 medicamentos encontram-se indisponíveis para pacientes, que precisam recorrer a compras com recursos próprios e em alguns casos, a ficarem sem a medicação por não possuir disponibilidade em farmácias. Cerca de 70 mil potiguares encontram-se com cadastro ativo para recebimento de medicamentos na Unicat-RN.
Segundo a lista da Unicat, dos 95 indisponíveis, 69
desses medicamentos já estão em processo de licitação e outros 15 aguardam
distribuição do Ministério da Saúde. Por fim, outros 12 medicamentos estão
indisponíveis, porém, sem pacientes cadastrados na Unicat para dispensação. O
órgão não informou quantos pacientes estão sendo prejudicados sem os
medicamentos.
“Parte aguarda envio pelo Ministério da Saúde e
outros o andamento das licitações, restando nisso uma série de fatores como
entraves burocráticos, demora por parte do fornecedor para entrega por falta de
estoque, entre outros pontos. De acordo com o acompanhamento dos processos de
aquisição, a perspectiva é de que a maior parte do abastecimento seja
regularizado ao longo de março e o restante até meados de abril”, disse em nota
a Secretaria de Estado da Saúde Pública do Rio Grande do Norte (Sesap-RN).
Segundo o diretor técnico da Unicat, Thiago Vieira,
vários fatores explicam o fato do órgão não dispor dos medicamentos em sua
completude, como insucesso em licitações e demora no envio de remédios por
parte do Ministério da Saúde, que segundo ele, é quem compra a 50% dos remédios
que a Unicat distribui. Para este ano, a execução para medicamentos deve girar
na casa de R$ 15 a 20 milhões, segundo interlocutores da Unicat.
“A gente tenta antecipar essas licitações, mas o que
acontece durante o processo não tem como prever. Existem recursos que os
fornecedores entram, por exemplo, às vezes fazemos a licitação e não é
apresentada proposta de licitação, e nisso precisa-se republicar o edital e
isso tem um tempo que é preciso seguir”, explica.
Um episódio que chamou a atenção recentemente foi o
de pacientes com asma que passaram a não ter acesso a medicação, problema que
se arrasta desde final de outubro. São quatro medicamentos em falta, como
formoterol, budesonida, e atorvastatina, que a Sesap não conseguiu dar
andamento à licitação e a compra dos medicamentos. Segundo Thiago Vieira, da
Unicat, cerca de 5,8 mil pacientes fazem parte desse grupo.
“No que tange à responsabilização do Estado, alguns
medicamentos estavam em falta por dificuldades na licitação. Um desses
remédios, que é o formoterol e a budesonida, para asma, e outros desse mesmo
grupo, estavam numa licitação que deveria ter sido finalizada em setembro e não
conseguimos terminá-la dentro do esperado. Abrimos processos emergenciais para
não ficar refém só de um resultado de um processo e agora no início de
fevereiro conseguimos fazer a aquisição dos medicamentos desse grupo. Temos
fornecedor, estamos no processo de assinatura de ata para eles entregarem o
medicamento. Trabalhamos para regularizar isso em abril” explica.
Decisão
Uma decisão da 1ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Natal determinou que o
Estado constitua uma equipe exclusiva de servidores para conduzir as aquisições
dos fármacos do Programa CEAF-SUS, que envolva a UNICAT, Setor de Compras e
Pesquisa Mercadológica, além do Setor de Contratos da Sesap. A decisão atende
uma Ação Civil Pública datada de 2015, do Ministério Público do Estado.
Na decisão, o juiz Airton Pinheiro determina a
dispensação dos medicamentos piridostigmina, sacarato de hidróxico férrico,
sulfassalazina, brometo de tiotrópio monoidratado, cloridrato de olodaterol,
brometo de umeclidinio, pilocarpina cloridrato, raloxifeno, vigabatrina e
brinzolamida. Todos os medicamentos seguem em falta na Unicat, segundo a lista
pública da unidade.
Durante o processo, o MPRN chegou a requerer o
bloqueio de R$ 8 milhões para compra dos medicamentos, situação que foi extinta
após a homologação de um acordo extrajudicial e determinada a devolução dos
valores bloqueados. Sobre este processo em específico, a Procuradoria Geral do
Estado (PGE) disse ainda não ter sido notificada da decisão.
“Existe uma ACP proposta pelo MP e não podemos
propor outra ação coletiva sobre o mesmo fato. Nessa ACP já tem sentença, já
tem decisão transitada em julgado falando da necessidade de regularização
desses insumos”, explica a Defensora Pública, Cláudia Queiroz.
Pacientes relatam angústia por falta de
remédios
Relatos de pacientes ouvidos pela TRIBUNA DO NORTE
dão conta de que a espera pelos medicamentos tem sido constante e em alguns
casos, necessitando de judicializações. É o caso de uma paciente servidora
pública do RN que pediu para não ser identificada, de 58 anos, que utiliza a medicação
para miastenia grave, doença autoimune em que a comunicação entre os nervos e
os músculos é afetada, produzindo episódios de fraqueza muscular. A medicação é
essencial no seu dia a dia, precisando de 120 comprimidos por mês.
“Sou paciente de miastenia grave. Recebo a medicação
aqui e é uma luta para que possamos ter essa medicação. Já fazem 8 meses que
estamos tentando receber a Azatioprina e até agora não existe, não tem. Na
farmácia, a medicação custa R$ 299 para quem toma 120 comprimidos/mês, que é o
meu caso. Tomo essa medicação há mais de 40 anos. Precisei entrar na justiça
para conseguir”, disse.
Em outros casos, a única alternativa é a espera. A
dona de casa aposentada Maria da Penha de Souza, 75 anos, que está com dois
medicamentos em falta na Unicat. Todos são para a osteoporose. “Estou com dois
remédios sem receber. Tem um que já tem mais de dois anos que não consigo.
Outro faltou aqui e saiu de linha nas farmácias. Preciso de outro para
substituir”, disse.
Outro paciente afetado é o motorista aposentado
Derocy Araújo Silva, 54 anos, que está com três de quatro medicamentos que
precisa tomar com frequência em falta na Unicat. “Já estão em falta há cerca de
três meses. Preciso tomar por conta da hemodiálise em virtude do cálcio e do
fósforo. Estou sem tomar, e nisso o ferro do sangue fica alto”, disse.
No ano passado, a TRIBUNA DO NORTE publicou a
reportagem “Estado teve bloqueio de R$ 37 milhões para medicamentos”, mostrando
que a falta de medicamentos ou a ausência de remédios em listas aprovadas pelo
Ministério da Saúde tem feito a judicialização na área disparar no Rio Grande
do Norte. Segundo dados da plataforma GPS Med, do Tribunal de Justiça (TJRN), o
Estado teve R$ 37,1 milhões bloqueados entre 2018 e 2022 para compra de
medicamentos, totalizando uma média de R$ 7,4 milhões por ano.

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