Com informações de Folha de S.Paulo e Poder 360
Os economistas Arminio Fraga, Pedro Malan e
Edmar Bacha escreveram uma carta pública pedindo ao presidente eleito, Luiz
Inácio Lula da Silva (PT) responsabilidade fiscal, para já ou o quanto antes.
Formuladores do Plano Real na década de 90, os 3 apoiaram o petista contra Jair
Bolsonaro (PL) na eleição presidencial.
O texto
em que alertam Lula sobre as consequências do discurso dele foi publicado nesta
5ª feira (17.nov.2022) em artigo na Folha de S.Paulo.
Leia a
íntegra abaixo:
Caro presidente eleito Lula,
Assistimos a sua fala nesta quinta (17)
cedo na COP27, no Egito. Acredite que compartilhamos de suas preocupações
sociais e civilizatórias, a sua razão de viver. Não dá para conviver com tanta
pobreza, desigualdade e fome aqui no Brasil.
O desafio é tomar providências que não
criem problemas maiores do que os que queremos resolver.
A alta do dólar e a queda da Bolsa não são
produto da ação de um grupo de especuladores mal-intencionados. A
responsabilidade fiscal não é um obstáculo ao nobre anseio de responsabilidade
social, para já ou o quanto antes.
O teto de gastos não tira dinheiro da
educação, da saúde, da cultura, para pagar juros a banqueiros gananciosos. Não
é uma conspiração para desmontar a área social.
Vejamos por quê.
Uma economia depende de crédito para
funcionar. O maior tomador de crédito na maioria dos países é o governo. No
Brasil o governo paga taxas de juros altíssimas. Por quê? Porque não é
percebido como um bom devedor. Seja pela via de um eventual calote direto, seja
através da inflação, como ocorreu recentemente.
O mesmo receio que afeta as taxas de juros
afeta também o dólar. Imagino que seja motivo de grande frustração ver isso
tudo. Será que o seu histórico de disciplina fiscal basta? A verdade é que os
discursos e nomeações recentes e a PEC (proposta de emenda à Constituição) ora
em discussão sugerem que não basta. Desculpe-nos a franqueza. Como o senhor
sabe, apoiamos a sua eleição e torcemos por um Brasil melhor e mais justo.
É preciso que se entenda que os juros, o
dólar e a Bolsa são o produto das ações de todos na economia, dentro e fora do
Brasil, sobretudo do próprio governo. Muita gente séria e trabalhadora,
presidente.
É preciso que não nos esqueçamos que dólar
alto significa certo arrocho salarial, causado pela inflação que vem a reboque.
Sabemos disso há décadas. Os sindicatos sabem.
E também não custa lembrar que a Bolsa é
hoje uma fonte relevante de capital para investimento real, canal esse que anda
entupido.
São todos sintomas da perda de confiança na
moeda nacional, cuja manifestação mais extrema é a escalada da inflação. Quando
o governo perde o seu crédito, a economia se arrebenta. Quando isso acontece,
quem perde mais? Os pobres!
O setor financeiro recebe juros, sim, mas
presta serviços e repassa boa parte dos juros para o resto da economia, que lá
deposita seus recursos.
O teto, hoje a caminho de passar de furado
a buraco aberto, foi uma tentativa de forçar uma organização de prioridades.
Por que isso? Porque não dá para fazer tudo ao mesmo tempo sem pressionar os
preços e os juros. O mundo aí fora está repleto de exemplos disso.
Então por que falta dinheiro para áreas de
crucial impacto social? Porque, implícita ou explicitamente, não se dá
prioridade a elas. Essa é a realidade, que precisa ser encarada com
transparência e coragem.
O crédito público no Brasil está evaporando.
Hora de tomar providências, sob pena de o povo outra vez tomar na cabeça.
Arminio Fraga
Sócio-fundador da Gávea Investimentos,
presidente dos conselhos do Ieps (Instituto de Estudos para Políticas de Saúde)
e do IMDS (Instituto Mobilidade e Desenvolvimento Social), ex-presidente do
Banco Central e colunista da Folha
Edmar Bacha
Diretor do Instituto de Estudos de Política
Econômica / Casa das Garças
Pedro Malan
Economista, foi ministro da Fazenda durante
o governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB)
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