O senador Otto Alencar
(PSD-BA), aliado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e favorito para
comandar a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, telefonou para o
ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), e fez um apelo para
que o magistrado revise suas decisões e libere as emendas parlamentares.
“Na área de saúde, a
retenção desses recursos vai dar um prejuízo muito grande para a população
porque não tem como funcionar sem essas emendas”, disse Alencar ao Estadão. “É
uma situação que você não pode imaginar. Ele (Dino) também não imagina. Tem
seguro de saúde, então ele não imagina. Isso me incomoda muito.” O ministro
Flávio Dino e o STF não comentaram as declarações.
O ministro Flávio Dino
suspendeu o pagamento das emendas em agosto do ano passado, apontando falta de
transparência e desrespeito às regras fiscais. Em dezembro, os recursos foram
liberados, mas sob uma série de condições com as quais os parlamentares não
concordam.
Nos últimos anos, emendas
bancaram compra de tratores superfaturados, asfalto com indícios de sobrepreço,
shows artísticos em cidade que estavam em calamidade e desvios na área de
saúde. Além disso, o governo e o Congresso tiraram dinheiro de órgãos
essenciais para turbinar os recursos de interesse eleitoral.
Todas essas práticas foram
condenadas pelo STF e pelo Tribunal de Contas da União (TCU). A Polícia Federal
começou a investigar parlamentares, assessores e prefeitos por suspeita de
desvios. Na última semana, a polícia deflagrou uma operação no Rio Grande do
Sul e identificou até um “contrato de propina” em hospital no Rio Grande do Sul
com dinheiro de emenda.
Agora, segundo as regras
do STF, recursos do orçamento secreto e das emendas de comissão só devem ser
liberados quando o governo identificar e dar transparência sobre quem são os
parlamentares beneficiados. As emendas Pix terão que passar por aprovação dos
ministérios. Os repasses para a saúde, por sua vez, dependerão do aval do
Sistema Único de Saúde (SUS) e das comissões formadas por gestores federais,
estaduais e municipais. Além disso, o dinheiro das emendas pode ser cortado de
crescer mais que outras despesas.
Congresso ameaça só votar
Orçamento com emendas liberadas
O Congresso aumentou a
pressão sobre o STF e sobre o governo Lula para a liberação das emendas.
Integrantes do Legislativo dizem que só vão votar o Orçamento de 2025, que
autoriza os gastos da União, após uma nova decisão favorável do Judiciário. É
no Orçamento que estão as verbas para o governo tocar os projetos prioritários
e também os recursos do Supremo.
É uma situação que você
não pode imaginar. Ele (Dino) também não imagina. Tem seguro de saúde, então
ele não imagina. Isso me incomoda muito.
Segundo Alencar, a
conversa com Dino ocorreu há uma semana. A principal queixa do senador é com as
emendas de bancada direcionadas à saúde. Emendas de bancada são recursos
indicados pelo conjunto de parlamentares de cada Estado no Orçamento da União.
O ministro proibiu que os congressistas dividam entre si a indicação dos
recursos, como se cada um tivesse um naco individual do bolo, prática conhecida
como “rachadão”. Na área de saúde, o STF exigiu que as emendas sejam aprovadas
pela máquina federal do SUS.
No final de dezembro, Dino
liberou excepcionalmente as emendas de saúde para cumprir o piso
constitucional, que determina um mínimo que a União deve gastar na área. Mas,
de acordo com o senador, mesmo com os recursos liberados, os gestores públicos
temem usar a verba na ponta com receio de cair em práticas condenadas pelo
magistrado. “A secretária estadual de Saúde da Bahia não se sente segura para
repassar o recurso porque ele não deu uma decisão clara. E com razão, porque
recai sobre o CPF dela.”
As palavras do senador
ecoam uma queixa constante nos bastidores do Congresso. O presidente da
Comissão Mista de Orçamento (CMO), deputado Julio Arcoverde (PP-PI), deixou
claro que os parlamentares estão esperando o STF liberar as emendas para só
depois votar o Orçamento do governo. “É contraproducente aprovarmos o relatório
da LOA sem a decisão final do STF sobre as emendas. Precisamos de segurança
jurídica para garantir um orçamento sólido e responsável. Entendo as
dificuldades enfrentadas pelos prefeitos e estou trabalhando diariamente para
que os municípios brasileiros não fiquem desamparados”, afirmou o parlamentar.
Os parlamentares prometem
dar transparência pedindo a liberação dos recursos. Foi a mesma promessa feita
em 2022, quando o Supremo declarou o orçamento secreto inconstitucional. As
práticas que levaram à derrubada do esquema, porém, se repetiram com outros
tipos de emendas. No próximo dia 27, Dino deve receber o presidente da Câmara,
Hugo Motta (Republicanos-PB), e o presidente do Davi Alcolumbre (União-AP),
para conversar sobre o impasse.
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