Na 107ª posição entre os 180 países presentes no
ranking de 2024, o Brasil atingiu sua menor nota (34 pontos) no Índice de
Percepção da Corrupção (IPC) da Transparência Internacional, o que também o
colocou na pior colocação anual na série histórica iniciada em 2012. O
resultado do ano passado representa uma queda de dois pontos e três posições em
relação a 2023.
Já na comparação com as melhores pontuações
brasileiras na série histórica — em 2012 e 2014 —, a redução foi de nove pontos
e 38 posições. Para Bruno Brandão, diretor-executivo da Transparência
Internacional-Brasil, a “presença cada vez maior e explícita do crime
organizado nas instituições estatais” mostra o “avanço do processo de captura
do Estado pela corrupção”.
— No caso brasileiro, houve um grande impulso
anticorrupção na última década, com a Operação Lava-Jato, mas o país falhou em
dois aspectos cruciais: ao invés de corrigir os erros dessa operação histórica,
liquidou-a por completo e, ainda mais importante, falhou em olhar para as
raízes sistêmicas do problema e avançar com reformas. Ao contrário, a corrupção
contra-atacou de maneira avassaladora e hoje, do ponto de vista legal e
institucional, estamos piores do que antes da Lava-Jato — avalia Brandão.
Se há dez anos o Brasil estava empatado com países
como Bulgária, Itália, Romênia, Senegal e Essuatíni (antiga Suazilândia), hoje
está em posição próxima à de nações como Argélia, Malauí, Nepal, Níger,
Tailândia e Turquia.
Produzido pela Transparência Internacional desde
1995, com uma série histórica comparável desde 2012, o IPC avalia 180 países e
atribui notas entre 0 e 100. Quanto maior o valor, maior é a percepção de
integridade do país.
A pesquisa conta com dados oriundos de diferentes
fontes que trazem a percepção de acadêmicos, juristas, empresários e outros
especialistas sobre o nível de corrupção no setor público de cada país
analisado.
Abaixo da média na América
Os mais bem colocados no Índice de Percepção da
corrupção do ano passado foram Dinamarca (90 pontos), Finlândia (88), Cingapura
(84), Nova Zelândia (83) e, empatados com 81 pontos, Luxemburgo, Noruega e
Suíça.
Já os países mais mal avaliados no índice foram
Sudão do Sul (com 8 pontos), Somália (9), Venezuela (10), Síria (12) e,
empatados com 13 pontos, Guiné Equatorial, Eritréia, Líbia e Iêmen.
O Brasil ficou abaixo da média dos países das
Américas (42 pontos) e da média global (43) do ano passado. Entre os países do
G20, grupo que teve presidência brasileira em 2024, o país ficou em 16º,
empatado com a Turquia e à frente apenas de México e Rússia.
A Transparência Internacional destaca que, com 34
pontos, o Brasil “encosta na média das notas dos países tidos como não
democráticos baseados em avaliação da Economist Intelligence Unit (33 pontos)”.
A ONG lançou junto ao IPC do ano passado o relatório
“Retrospectiva Brasil 2024”, em que analisa os principais avanços e retrocessos
em transparência e no combate à corrupção no período.
Entre os destaques negativos apontados estão o
“silêncio reiterado do presidente Lula sobre a pauta anticorrupção”, a
“institucionalização da corrupção em larga escala com a persistência,
agigantamento e descontrole das emendas orçamentárias, em franca insubordinação
às decisões do Supremo Tribunal Federal (STF)”, e a “aprovação da Proposta de
Emenda à Constituição (PEC) da Anistia”.
Por outro lado, entre os pontos destacados como
avanços no campo anticorrupção estão “decisões do STF no sentido de dar maior
transparência e rastreabilidade às emendas parlamentares” e o avanço de
“investigações contra redes de corrupção de juízes de forma inédita, embora
ainda sob riscos de obstruções à apuração do envolvimento de membros de
tribunais superiores”.
Impacto na agenda climática
Ainda que aponte o avanço de ações da Estratégia
Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro (ENCCLA) como
instrumentos de combate à corrupção ambiental, o relatório demonstra o impacto
da persistência da criminalidade na área na agenda climática.
Gerente de programas da ONG, Renato Morgado aponta
que as práticas de corrupção “distorcem políticas e decisões públicas, e
desviam os recursos necessários para as medidas de mitigação e de adaptação”:
— Desvios no Departamento Nacional de Obras Contra
as Secas (Dnocs), um dos principais órgãos federais responsáveis pelo combate
às secas no Nordeste, fraudes em projetos milionários de créditos de carbono e
investigações de venda de sentenças por magistrados em esquemas de grilagem de
terras, reforçam que só avançaremos de forma consistente na agenda climática, a
partir de uma abordagem anticorrupção.
A corrupção, nesse contexto, além de afetar a vida
de milhões de pessoas ao exacerbar a crise climática, provoca violência direta
contra defensores e defensoras ambientais, aponta a Transparência
Internacional.
“O Brasil só enfrentará com eficiência as mudanças
climáticas caso implemente medidas adequadas de prevenção e combate à
corrupção. O país tem a oportunidade de demonstrar isso para o mundo, em
especial no contexto em que receberá a COP do clima, neste ano, em Belém, caso
reforce a transparência e a integridade dos órgãos e políticas relacionadas à
agenda climática”, conclui a ONG.
O Globo

Nenhum comentário:
Postar um comentário