Acompanhando o voto do relator, desembargador
Claudio Santos, o Pleno do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJRN)
suspendeu, nesta quarta-feira (30), à unanimidade, os efeitos da Lei
Estadual nº 11.587/2023 e do Decreto Estadual nº 33.738/2024, que estipulam
reserva de 5% em vagas para empregos, para travestis e pessoas trans, em
empresas beneficiadas por incentivos fiscais estaduais. A decisão vale até o
julgamento final das duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade interpostas no
Tribunal de Justiça referentes ao assunto. As informações foram divulgadas pelo
TJRN.
O entendimento da Corte de Justiça do RN é que os
dispositivos ferem os princípios da legalidade, livre iniciativa e
anterioridade tributária, além da não observância à competência privativa da
União para legislar acerca de direito do trabalho, entre outros pontos. Um dos
aspectos destacados pelo relator é que ao impor condições específicas para
manutenção de contratos e convênios firmados entre empresas privadas e o
Estado, como exigência de reserva de vagas de empregos, o Estado interfere nas
normas que regem as contratações pelo poder público.
As ações foram apresentadas por entidades ligadas ao
setor privado e têm como objetivo a declaração de inconstitucionalidade
da Lei e do Decreto nº 33.738/2024, que impõe a reserva de 5% das vagas
de emprego para travestis e transexuais em empresas privadas que recebem
incentivos fiscais ou mantêm convênios com órgãos públicos do RN. As federações
alegaram que “a aplicação da lei poderá resultar em prejuízos significativos
para as micro e pequenas empresas, que teriam que readaptar seus quadros de
funcionários, potencialmente resultando em demissões e instabilidade
econômica”.
Para o relator, em relação às normas estaduais em
análise, ficou evidenciada a incompatibilidade vertical entre a Lei e o
Decreto Estadual. Salientou que o artigo 22, inciso I, da Constituição
Federal, ao ressaltar ser competência exclusiva e privativa da União legislar a
respeito de direito do trabalho, de maneira a assegurar a uniformidade das
normas trabalhistas no país. “A mesma lei estadual também incorre em
inconstitucionalidade ao legislar sobre normas gerais de licitação e contratação,
matéria igualmente reservada à competência privativa da União, conforme o art.
22, inciso XXVII, da Constituição Federal”, destaca o desembargador
Claudio Santos.
O entendimento do relator, seguido pela Corte de
Justiça, observa que a lei infringe o princípio da livre iniciativa, consagrado
no artigo 170 da Constituição Federal, pois impõe ao empresariado
obrigação que interfere, de forma direta, na sua liberdade de gestão e na
administração de seus recursos humanos. “A inclusão de minorias deve ser buscada
por meio de medidas afirmativas justas, equilibradas e bem fundamentadas, e não
por meio de imposições legais arbitrárias que podem gerar efeitos negativos
tanto para as empresas quanto para os trabalhadores”.
Além disso, “a Lei Estadual n. 11.587/2023, ao impor
a reserva obrigatória de vagas como condição para a manutenção de benefícios
fiscais, introduz uma nova obrigação que, se descumprida, resulta na perda dos
benefícios fiscais, o que representa, em essência, uma majoração indireta da
carga tributária”, frisa o relator.
Entidades e Governo
As Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADINs)
foram propostas pela Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Norte
(Fiern), Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado do Rio
Grande do Norte (Fecomércio/RN), Federação de Agricultura, Pecuária e Pesca do
Rio Grande do Norte (Faern) e a Federação das Empresas de Transporte de
Passageiros do Nordeste.
As entidades sustentam que a alteração das condições
para manutenção dos benefícios fiscais consiste em majoração indireta de
tributos. Além disso, embora a inclusão social seja importante, deve ser
promovida através de políticas públicas, “e não pela transferência de
responsabilidades ao setor privado”.
Por sua vez, o Governo do Estado pontuou que a lei
questionada tem o objetivo de garantir a dignidade da pessoa humana e afastar
os efeitos da discriminação no mercado de trabalho, que dificultam o acesso a
vagas de emprego por travestis e transexuais e acrescentou que a política de
preferência de contração dessas pessoas ganha destaque nas instituições
públicas, “não sendo nenhuma surpresa que a mesma ação afirmativa chegasse,
também ao setor privado, especialmente, àquele que recebe incentivos fiscais
para a prestação de sua atividade econômica”.
Lembrou ainda há 33 anos existe política semelhante
de reserva de vaga no segmento privado para público formado por pessoas com
deficiência. Para o Poder Executivo Estadual, a medida foi concebida para
incentivar as empresas que queiram captar recursos públicos a fomentar a oferta
de vagas ao público em questão, marginalizado historicamente no mercado de
trabalho.
Tribuna do Norte
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