A pandemia de Covid-19 provocou um ano atípico no Rio
Grande do Norte, fez com que boa parte das pessoas mudasse a rotina e ficasse
em isolamento social, dentro de casa. Os empregos foram adaptados e muitos
viraram home office, numa tentativa de prevenir o contágio pelas ruas.
Enquanto isso acontecia e o vírus se espalhava pelo
estado, os médicos, por sua vez, tiveram uma sobrecarga no trabalho e
precisaram lidar com o estresse, o medo da doença e a tristeza das perdas de
maneira muito próxima, vivendo o dia a dia de um cenário pouco aconchegante.
Um desses casos é o do médico Juliano Silveira, de 35
anos, que neste Dia do Médico, ainda segue em atuação constante na linha
de frente da doença. Ele trabalha em dois hospitais públicos e um privado em
Natal.
"Esses meses foram bem tensos, porque a gente
teve que se desdobrar cada vez mais em conseguir dar assistência. E colegas
adoeceram. E a gente teve, todo mundo, que se ajudar bastante", relata.
O médico conta que o período de maior angústia que
viveu foi quando as unidades de saúde públicas e privadas de Natal
superlotaram, entre os meses de maio e junho.
"Pra mim, foi angustiante ver os pacientes sendo
encaminhados para a urgência pública e não terem como ser atendidos. Ver os
pacientes sendo encaminhados para urgência privada e o pronto-socorro ter que
fechar as portas por falta de capacidade", diz.
"O que gerou mais angústia na pandemia foi isso:
saber que nossa rede hospitalar não estava preparada para receber essa
pandemia".
Tempo de medo e perdas
Lutando na linha de frente da batalha contra o
coronavírus, os médicos e profissionais da saúde se expõem mais ao risco de
contágio. Mas, apesar do receio, cumprem a missão de atender.
"Esse período realmente gera um pouco de medo,
principalmente pelo nosso adoecimento e dos nossos familiares", relata
Juliano.
O médico conta ainda que os profissionais precisaram
passar também por situações pouco comuns e bem delicadas, como a internação de
colegas da área. "Tivemos muitos colegas com adoecimento importante,
inclusive com hospitalização. Colegas de trabalho, do dia a dia", conta.
"E é uma cena bem impactante para um
médico ver outro colega médico que estava naquele convívio na luta e padece da
doença".
Ele relata que perdeu colegas e pessoas próximas nessa
pandemia, inclusive um aluno de 23 anos para quem dava aula em uma
universidade. "Eu tive a oportunidade de internar alguns colegas médicos
na instituição em que trabalho e também vivenciei a perda de pacientes e de
colegas profissionais próximos".
O médico inclusive chegou a ter a suspeita da Covid-19
e ficou em isolamento. O resultado, no entanto, deu negativo.
Cuidado redobrado
O medo do médico também é pelos pacientes. Apesar de
trabalhar em urgência, a especialidade de Juliano é a geriatria, o que o faz
lidar diretamente com um dos grupos de maior risco da Covid-19, uma preocupação
a mais nos atendimentos.
"Com a geriatria, minha rotina mudou muito,
porque os idosos são grupo de risco. Então, teve o advento da telemedicina que
veio para facilitar a comunicação entre médico e paciente", fala.
Por vezes, no entanto, o atendimento presencial é
necessário, inclusive em domicílio. Ele chegou a atender alguns pacientes com
sintomas respiratórios.
"Há uma preocupação redobrada na visita do idoso
no domicílio, temos todos os cuidados de paramentação. Nunca a gente faz a
visita combinada com outros hospitais. Ou seja, nessa visita a gente sai de
casa e, quando termina a visita, volta pra casa pra ter todo o cuidado com a
higienização".
"É um cuidado redobrado e uma atenção
porque a gente sabe que a população idosa realmente sofre bastante nesse
adoecimento pelo coronavírus".
Todo material usado, ele conta, é descartável e após o
uso é desprezado e sinalizado para coleta. Essa preocupação, segundo o médico,
ainda vai continuar por algum tempo.
Buscar alternativas
Os médicos e profissionais de saúde têm passado por um
período de desgaste físico e mental, o que pode ser sentido até na ausência da
relação com as pessoas mais próximas devido ao isolamento social.
"A gente também teve que abdicar de muitas coisas
gostosas que gostávamos de fazer e de pessoas queridas por causa da questão da
pandemia. Então houve sim o impacto no profissional de saúde. A gente teve que
se policiar em relação a isso", diz Juliano.
Por isso, ele conta que é necessário buscar
alternativas para desopilar. "A gente tem que procurar algumas ilhas de
lazer, mesmo no isolamento. Mesmo em casa, procurar um hobby, alguma coisa que
gosta de fazer, seja tocar um instrumento, ler um bom livro, assistir alguma
coisa na televisão que não seja notícia ruim. Sempre tem que procurar alguma
alternativa".
"Eu gosto muito de assistir séries de ficção
científica, de suspense, gosto de ler um pouco, gosto muito de jogos
eletrônicos, de videogame. Minha verdadeira fuga confinada foram realmente
essas, que infelizmente não são a realidade de todo brasileiro", admite.
O médico segue atuante no combate à Covid-19 e
seguindo as medidas sanitárias para evitar o contágio e a propagação da doença.
Por isso, mantém o alerta ligado.
"Vai ser uma preocupação constante, porque a
gente não tem uma previsão de encerramento da infecção pela Covid-19. A gente
tem uma diminuição no número de casos, mas que ainda vai apresentar um
constância nos próximos meses".

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