A falta de progressos nas negociações comerciais
entre Brasil e Estados Unidos chama a atenção. Outros países, incluindo membros
do Brics, como China, Índia, Indonésia e Vietnã, têm avançado de forma
significativa nas tratativas com o governo Trump.
Em entrevista à CNN Internacional, o presidente Lula
disse que houve “mais de dez” reuniões do vice-presidente e ministro do
Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Geraldo Alckmin, e do chanceler Mauro
Vieira, com integrantes do governo americano. E que o Brasil mandou uma carta
no dia 16 de maio com uma proposta, sem obter resposta.
Não é o caso de outros países. A Indonésia firmou
acordo na terça-feira (15) com os Estados Unidos, reduzindo as tarifas
americanas de 32% para 19% sobre produtos indonésios. É alta, mas é a mais
baixa conseguida em acordos de outros países do Sudeste Asiático com os Estados
Unidos: o Vietnã, também novo membro do Brics, aceitou 20 %; Filipinas, 21 %;
Malásia, 25 %; Tailândia e Camboja, no mínimo 36 %.
Em troca, a Indonésia se comprometeu a comprar
US$ 15 bilhões em energia dos EUA, US$ 4,5 bilhões em produtos agrícolas e 50
aviões da Boeing. Foram eliminadas ainda tarifas sobre exportações americanas à
Indonésia e estabelecidas penalidades para mercadorias chinesas reexportadas
através do país.
A Índia, como a Indonésia integrante do Brics, está
em estágio avançado de negociação para um acordo provisório, que prevê a
redução de tarifas recíprocas com os Estados Unidos. Uma equipe indiana esteve
em Washington para a quinta rodada de discussões, e ambos os lados demonstram
otimismo de que um acordo possa ser fechado nas próximas semanas. O próprio
presidente Donald Trump fez referência a isso.
A China, líder do Brics e principal adversária dos
Estados Unidos, obteve no dia 12 de maio acordo preliminar com o governo
americano. Os EUA reduziram sua sobretaxa de 145 % para 30 % e a China, de
125 % para 10 %.
Diante da alíquota imposta por Trump em abril, o
governo em Pequim suspendeu o fornecimento de minérios estratégicos para os
Estados Unidos, que reagiram restringindo ainda mais a exportação de chips sofisticados
para a China. Isso foi superado em maio. Ou seja, são questões bem mais
estratégicas do que as que os Estados Unidos têm com o Brasil.
Com o Japão, o contencioso gira em torno de
barreiras japonesas à importação de automóveis e cereais americanos. São dois
setores muito sensíveis para a economia e até para a cultura japonesa. No caso
dos automóveis, cujas exportações representam 3% do PIB, o Japão impõe regras
de segurança consideradas excessivas para os padrões americanos. E o Japão
preserva sua segurança alimentar e sua agricultura quase como tabus.
Mesmo assim, as negociações não foram concluídas
principalmente porque o Japão realiza eleições para a Câmara Alta (equivalente
ao Senado) no domingo. O Partido Liberal-Democrata, no governo, sente-se
vulnerável a discursos nacionalistas na oposição.
Mas tem havido telefonemas entre os ministros do
Comércio dos dois países e o primeiro-ministro Shigeru Ishiba pretende se
reunir com o influente secretário americano do Tesouro, Scott Bessent, antes do
prazo fatal de 1º de agosto.
A Coreia do Sul iniciou negociações com os Estados
Unidos imediatamente depois das tarifas anunciadas por Trump no dia 2 de abril,
mesmo em meio ao processo de impeachment de seu presidente, Yoon Suk Yeol.
Estão em discussão a abertura do mercado agrícola e cooperação industrial,
incluindo a revitalização de estaleiros nos Estados Unidos, além de medidas de
contenção da China. Acordo “de princípio” pode ser firmado até 1º de agosto.
Negociações estão em curso com o objetivo de evitar
tarifas de até 30% sobre produtos mexicanos, não contemplados pelo acordo
comercial USMCA, com prazo para 1.º de agosto. Também está sendo discutida a
tarifa de 25% imposta por Trump sobre aço de todos os países.
A Argentina ficou com a tarifa de 10%, imposta por
Trump aos países com superávit americano na balança comercial, como é o caso do
Brasil. Os dois países negociam um acordo de tarifa zero para 70% a 80% dos
produtos. Bessent visitou Buenos Aires em abril.
*Por Lourival Sant’Anna – CNN Brasil – Analista
de Internacional. Fez reportagens em 80 países, incluindo 15 coberturas de
conflitos armados, ao longo de mais de 30 anos de carreira. É mestre em
jornalismo pela USP e autor de 4 livros
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